Um dos maiores nomes do Surrealismo, René Magritte (1898-1969) foi o criador de telas memoráveis que intrigam os observadores até os dias de hoje.
Apesar de ser mais conhecido pela sua obra-prima A Traição das Imagens (1929), Magritte foi a mente genial por trás de uma série de obras brilhantes.
Conheça agora os dez maiores trabalhos do pintor.
1. A Traição das Imagens (1929)
Pintada em 1929, a tela A Traição das Imagens é uma obra que coloca o espectador para refletir sobre os limites da representação e do próprio objeto.
A legenda explicativa escrita com uma letra escolar faz o observador questionar a fronteira da arte e do real. A palavra cachimbo não designa um cachimbo real, essa é uma constatação que parece óbvia, mas que foi levantada com muita propriedade pelo pintor belga.
Trata-se de uma imagem revolucionária no mundo das artes, não por acaso a obra foi cercada de muita polêmica quando divulgada. Segundo o próprio pintor:
O famoso cachimbo. Como as pessoas me censuraram por ele. Contudo, me diga, você pode preenchê-lo? Claro que não, é uma mera representação. Caso tivesse escrito no quadro: Isto é um cachimbo, teria mentido.
2. O Filho do Homem (1964)
A pintura de um homem com terno, gravata vermelha e um chapéu-coco – totalmente fora do contexto da paisagem – com uma maçã verde a frente da face é uma das obras mais celebradas de René Magritte.
A figura, em posição estática, encontra-se com o horizonte ao fundo (e de costas para ele), tendo um céu nublado o coroando e um pequeno muro as suas costas. A imagem é tão icônica que foi absorvida pela cultura pop e hoje em dia é massivamente reproduzida.
Inicialmente a pintura seria um autorretrato de Magritte (encomendado pelo seu próprio mecenas), mas logo o pintor quis transformar o trabalho em outra coisa, possivelmente numa discussão mais conceitual entre o visível, o oculto e a curiosidade humana.
3. Golconda (1953)
Os homens representados como gotas de chuva intrigam o observador. Praticamente idênticos, não é possível perceber bem se eles flanaram do chão ou se despenderam do céu. Apesar de terem feições semelhantes, ao se observar de perto vemos como os homens são distintos entre si, induzindo o espectador a participar de um jogo de observação de semelhanças e diferenças.
Todos os homens usam sobretudos negros e chapéus-coco, o pano de fundo é um prédio vulgar do subúrbio, também com janelas iguais, e um céu azul na parte superior da tela. A tela levanta questionamentos sobre a individualidade e sobre a identidade de grupo: até que ponto os sujeitos são autônomos ou se comportam conforme de acordo com a massa?
Uma curiosidade sobre o nome do quadro: Golconda é uma cidade em ruínas (mais precisamente uma fortaleza próxima de Hyderabad) situada na Índia, famosa pelo comércio de diamantes. Muita gente se pergunta porque Magritte deu o nome dessa cidade à sua tela. Alguns teóricos da arte sugerem que a posição dos homens de chapéus-coco se assemelha à estrutura do diamante.
4. Os Amantes (1928)
Pode-se dizer que a tela Os Amantes é, no mínimo, perturbadora e intrigante. No centro do quadro está um casal aparentemente apaixonado com o rosto coberto.
Bastante próximos, eles se beijam, embora estejam com a boca tapada. Não conseguimos ver a identidade dos amantes e só podemos distinguir o sexo dos personagens pela roupa que carregam.
Uma dúvida paira no ar: de quem eles escondem o rosto? Um do outro? Do espectador? Dos possíveis parceiros oficiais? Os véus seriam uma forma metafórica de afirmar que o amor é cego?
Assim como muitas obras surrealistas, Os Amantes encerra mais perguntas do que respostas e por esse mesmo motivo cativa o observador.
5. Decalcomania (1966)
O nome do quadro faz referência a uma estratégia de pintura. A decalcomania é a técnica de pressionar uma folha de papel sobre uma superfície pintada e removê-la.
Na tela acima Magritte faz justamente uso da técnica incitando um jogo com a ilustração do homem de costas voltadas para o público.
Parece que o protagonista anônimo foi retirado do plano da direita tendo sido deslocado para o plano da esquerda, deixando a memória do seu corpo, o seu contorno, registrado como uma espécie de janela de onde se pode ver o horizonte.
6. Valores Pessoais (1952)
O óleo sobre tela de Magritte apresenta objetos hipertrofiados, em proporções completamente não usuais, causando um imediato estranhamento e desconforto no espectador.
Na tela Valores Pessoais, objetos cotidianos como o pente e o pincel de barba aparecem enormes enquanto a cama e os tapetes figuram minúsculos no cômodo que tem as paredes pintadas como o céu.
Em resumo, não só os objetos causam certa desorientação no público como também a própria noção de dentro e fora aparece problematizada na pintura.
7. O Espelho Falso (1928)
A tela a óleo pintada por Magritte foca apenas no olho humano esquerdo superdimensionado, com um zoom muito apurado evidenciando cada elemento da estrutura ocular.
A imagem de Magritte, no entanto, tem a particularidade de apresentar os contornos do céu onde habitualmente estaríamos acostumados a ver a íris.
O questionamento principal aqui pode ser traduzido da seguinte maneira: estaríamos vendo o olho humano refletindo o céu ou o céu que acaba por ser emoldurado por um olho humano?
8. Perspicácia (1936)
Na tela Perspicácia o protagonista, um pintor, é flagrado desenhando um pássaro numa tela pousada em um cavalete enquanto observa um ovo disposto sobre a mesa ao lado.
Na imagem intrigante é como se o artista pudesse, a partir do ovo, adiantar o que viria no futuro (o pássaro).
O pintor, sentado, com o pincel na mão direita e a paleta na esquerda, fita compenetrado o ovo encarando-o como uma possibilidade de futuro. O artista é o único que vê aquilo que ninguém mais vê: enquanto todos encaram um ovo, o artista prevê o que será dele amanhã.
9. Tempo Trespassado (1938)
Uma sala, uma lareira com um espelho por cima. Vemos apenas um trecho da sala, que tem um aspecto não fora do normal. O que chama a atenção aqui é o trem rompendo o limite da parede na parte de dentro da lareira.
O fumo que deveria ser produzido pelo aquecimento é, na verdade, o fumo que é lançado pela chaminé do trem flutuante.
É curioso que apesar da imagem não fazer qualquer sentido (um trem atravessando uma parede, flanando sem nenhum ponto de apoio no chão) ela respeita algumas leis do mundo real como por exemplo a projeção da sombra.
10. A Reprodução Interdita (1937)
Um homem diante do espelho, com um livro em cima da mesa do seu lado direito, a luz do dia entrando pela janela do lado esquerdo. Até então pela descrição poderíamos dizer que se tratava de uma pintura convencional e não de uma obra surrealista.
O que foge do normal na pintura A Reprodução Interdita é o fato do espelho não reproduzir a imagem do protagonista e sim duplica-la: ao invés de vermos o homem de frente assistimos novamente a sua silhueta de costas.
É curioso que o espelho faz o que era suposto em relação à todo o resto da paisagem: ele reflete com perfeição a bancada e o livro que está posicionado acima dela. O homem, no entanto, não obedece às leis da lógica e permanece anônimo, confundindo o espectador.
Quem foi René Magritte
O pintor belga René François Ghislain Magritte (1898-1969) ficou conhecido no mundo das artes apenas pelo primeiro e último nome.
Filho de um tecelão com uma chapeleira (o que explica muito da sua obsessão pelo chapéu-coco), quando completou a maioridade ingressou na Académie Royale des Beux-Arts de Bruxelas.
Aos 22 anos realizou a sua primeira exposição profissional e, seis anos mais tarde, conseguiu se dedicar exclusivamente à pintura. Antes disso, René precisou trabalhar criando anúncios e posteres.
Consta que a sua primeira obra surrealista, pintada em 1926, foi Le Jockey Perdu, mas a peça não teria feito grande sucesso.
No ano a seguir Magritte se mudou para Paris onde começou a ter um contato mais estreito com os membros do movimento Surrealista, entre eles o escritor André Breton, líder do grupo.
Em Paris, Magritte assinou um contrato com uma galeria, o que o permitiu produzir uma série de obras que viriam a ser consagradas como Os Amantes e O Falso Espelho.
A obra principal do pintor belga, A Traição das Imagens, foi concebida em 1929. Toda a sua obra procura multiplicar perguntas e questiona especialmente o limite da representação, a fronteira entre a arte e o real, a relação entre o visível e o oculto e a tênue fronteira entre o individual e o coletivo.
De volta a Bruxelas, René continuou pintando até a morte, que aconteceu no dia 15 de agosto de 1967.
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